As teorias do crescimento económico, depois de lhe reconhecerem
como fatores o trabalho e o capital, também reconheceram como tais: as
inovações tecnocientífica (R. Solow…), de gestão etc., e as instituições (ex.
patentes, direitos de autor) que devem ser elas próprias inovadas de forma a
promoverem e protegerem aquela outra inovação em geral (D. North…).
No contexto açoriano, este jornal – por cujo
aniversário hoje estamos todos (mas primeiro os seus responsáveis e
profissionais) de parabéns! – diversas vezes me abriu as suas páginas para abordar
inovações tecnológicas, até científicas, e eventualmente institucionais,
algumas das quais relevantíssimas para a economia e a sociedade desta ilha e do
arquipélago.
Foi o caso do complexo pessoal, social, económico e
tecnológico que, no fim da primeira metade do séc. XX, potenciou a fileira do
leite tal como todos hoje a conhecemos. V. “A modernização da indústria de laticínios em S. Miguel – 1937-1946”, se não me falha a memória, publicado precisamente
neste suplemento pelo aniversário do C.A.
há dois anos.
Ainda sobre essa fileira, foi o caso da referência às
ordenhas móveis e ao fio elétrico para demarcação de pastagens. Inovações tecnológicas
adaptadas e desenvolvidas pelos açorianos, e não apenas importadas para este
arquipélago (“Da essência da tecnologia – um caso açoriano”).
Quanto à inovação científica, o atualizadíssimo
contributo micaelense para aquele que seria então o mais importante processo
científico em curso no mundo – o trabalho de Darwin sobre a evolução das
espécies – por Francisco Arruda Furtado, foi aqui abordado numa “Viagem aos primórdios do darwinismo social em Portugal”.
Para mais recentemente termos proposto nestas páginas
uma inovação agora sobre o modo institucional de se tomar decisões tecnológicas
com impacto público. Nomeadamente, pela importação de um processo, de origem
dinamarquesa, de democracia deliberativa ou participativa (“Incineradora, participação pública, e hipótese de uma ‘conferência de consenso’”).
Basta uma pequena resenha como essa para sugerir quão
a inovação tecnológica, científica e institucional tem sido implementada, ou
proposta, nesta terra pelo menos desde o séc. XIX! Com os impactos que a
referida teoria do crescimento económico permite compreender.
Hoje, porém, desafiado que fui para uma pequena
reflexão sobre o tema, venho antes enfatizar a inovação nas nossas vidas
quotidianas.
Em linha com Norbert Alter, que define a inovação como
a transformação de uma descoberta, seja de um produto, de um processo técnico,
ou de relações sociais, profissionais, etc., em novas práticas.
De forma que a inovação se joga no quotidiano, nos
comportamentos individuais desde os de uma professora aos de um operador de
grua. Já a descoberta/invenção de um novo programa informático, de um novo
processo cirúrgico… são apenas requisitos para as inovações que, depois, cada operador
informático, cada médica… realizará se
transformar aquelas descobertas/invenções em novas práticas.
Esse sociólogo francês segue o célebre economista
austríaco Joseph Schumpeter, que distinguiu três passos no processo criador: o
da invenção por indivíduos marginais; que são copiados quando surge a
perspetiva de ganhos associados a essa novidade; a qual enfim é normalizada
mediante uma sua institucionalização. Que será destruída por novas criações,
etc.
Como Alter porém salienta, esse processo não é
automático – ex. o uso da charrua de rodas foi lentamente estabelecido na Idade
Média, pois ajustava-se preferencialmente a grandes campos abertos, cuja
constituição era dificultada pela estrutura dos direitos de propriedade. São
necessárias redes de influência que
implementem esses processos desde a apresentação da invenção à normalização
desta.
Redes que se constituem nas escolas, nas empresas, nos
órgãos do Estado, na comunicação social… Nas quais, desde logo, os transgressores devem ser estimulados,
protegidos, e atendidos. Não propriamente a transgressão que vise destruir todo
o sistema social de inovação e produção, mas sim a que funciona nas suas margens: aproveitando o que nesse
sistema facultará o desenvolvimento, e eventualmente a implementação da
inovação.
Esses transgressores, indivíduos ou equipas, antes da
eventual normalização das suas propostas trabalham quase clandestinamente. Mas
o autor também reconhece que o seu trabalho requer alianças com quem lhes
faculte as condições mínimas para esse último. Daí a necessidade de uma sua
relativa proteção institucional.
A qual normalmente não se pode segurar se não em
crenças e convicções – desenganem-se os gestores que recusam qualquer
incerteza, e que pretendem lucros mas sem quaisquer riscos! Pois não existe
processo, dedutivo e teórico ou indutivo e experimental, que garanta o sucesso
futuro de algum novo produto, ou de alguma nova organização.
Assim, também alguma margem de fracasso tem que ser
concedida aos mencionados transgressores. Tal como estes deverão saber
integrá-lo.
Um pormaior
final: quase contra as minhas formulações anteriores, não existem os inovadores ou transgressores, de um
lado, e os normalizados ou
institucionais, do outro. Inovação e normalização são antes atitudes que, cada
um de nós, pode assumir nuns contextos, abandonar noutros e assumir a inversa,
etc. É, portanto, no seio de cada pessoa que primeiramente se joga a inovação.
E nesse jogo, diria, nos realizamos precisamente como pessoas.
Adaptado de: Correio dos Açores, Edição especial 97º aniversário, "Inovação, ciência e tecnologia", 01/05/2017
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