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Ciência: introdução aos métodos, objetividade e valores - coleção de videos com M. Weisberg (U. Pensilvânia)

1.1. Ciência: passado e presente

TÓPICOS - Aristóteles como o 1º cientista. Génese do termo "cientista". v. Questões como a objetividade e grau de certeza dos métodos científicos, a interferência de valores não-científicos nos processos científicos... Big Science vs. reflexões solitárias. Questões da filos. ciênc., e por que tratá-las.

1.2.1. Ex. - Teoria da evolução

TÓPICOS - Organismos e ambiente - de Aristóteles a Darwin. Seleção natural. Formas de estudar a evolução contornando a impossibilidade de regresso ao passado (observação natural, experiência controlada...). Tecnologia (CRISPR-Cas9) de retorno ao passado para o alterar e exploração de outros futuros seus.

1.2.2. Ex. - Datação do Universo

TÓPICOS - Teoria relatividade - gravidade como efeito da matéria/energia no espaço-tempo. 2 Formas de mudar ideias (conversa com pares, experiência pessoal). Conceção de 1 fenómeno não por perceção direta, mas mediante 1 efeito que, teoricamente, lhe será próprio - construção do objeto científico e não apenas da sua explicação. Da determinação do valor da constante de Hubble à datação do Universo. Distância entre galáxias, medida do desvio para o vermelho das suas radiações... e meios indiretos de cálculo destes meios indiretos para a constante de Hubble. Particularidade das Cefeidas. 1 Razão de suporte de 1 teoria. 3 Traços epistemológicos comuns entre o ex. teoria sobre evolução e adaptação das espécies e este ex. da descoberta e mensuração da expansão do Universo (observação cuidadosa, revisão geracional (cf. progresso!), convergência de diferentes linhas de observação/análise. Big Sciernce vs. estudos isolados.

1.2.3. Ex. - Alterações climáticas

TÓPICOS - Como a ciência pode chegar a posições que também podem ser intuitivas. O reconhecimento de 1 facto (alter. clim.) começa com 1 teoria (ef. estufa). O efeito de estufa. teoria faculta previsões, mas confirmação da ocorrência decorre de evidências empíricas e simulações. Conhecimento causal mais e menos seguro (v. dificuldade de modelação). Diferentes graus de certeza na análise do passado e na previsão do futuro (por contingência deste). Como se reforça a autoridade/reputação de cientistas e teorias.

1.2.4. Ex. - A teoria da mente

TÓPICOS - De que trata a teoria da mente. Ex. de conhecimentos inferenciais sobre as mentes dos outros. Evolução do poder mental de criança a adulto - tarefas da crença falsa, da fotografia falsa... Diferenças no design de experiências controladas, nos resultados delas, e na interpretação destes. Condicionalismos éticos na experimentação.

1.3. Temas diversos, métodos comuns

TÓPICOS - 1ª Reflexão sobre os 4 ex.: diferenças entre os métodos de pesquisa nesses casos físico, biológico, sobre a Terra, e sobre o comportamento. Diferenças nas escalas de espaço e de tempo. Da observação das ciências tal qual se fazem à tese de que pouco têm em comum - não há "a ciência". 4 Elementos comuns nos ex. - a desenvolver na secção 2: observação cuidadosa, experimentação controlada, convergência e robustez teórica, acumulação de evidências no tempo. Temas para secção 2.



2.1.1. Introdução ao empirismo científico

TÓPICOS - 1 Caso exemplar. Evidências (indícios) circunstanciais vs. causais. Regra para determinar relações causais (entre substâncias bioquímicas e fenómenos orgânicos). "Padrão de oiro" (gold standard) para estabelecer relações (farmacêuticas) causais - experiência aleatória (ramdomized trial). A verificação de resultados e a avaliação por pares. Fundamento teórico das experiências controladas mas aleatórias - compromisso com a tese do empirismo científico. Relevância do protocolo da experiência dificultar enviesamentos (bias) subjetivos. Presente foco no que distingue o conhecimento "científico" dos conhecimentos matemático (!), artístico ou religioso: observações, experiências e simulações.

2.1.2. Fundamentação na observação

TÓPICOS - "Empirismo científico" - um princípio científico fundamental. Da história da conceção empirista das ciências. [Retificação - a tradição platónica valorizava a matemática, mas como etapa para o conhecimento das Ideias, e não valorizava a observação natural de "cópias" daquelas Ideias; a tradição aristotélica valorizava esta observação, mas não a matemática; com a Rev. Científ. séc. XVII correlacionaram-se as 2]. "Grounded" (fundamentado - significado. 3 Razões da observação como fundamento do conhecimento científico - abertura pública e verificabilidade; abertura e libertação de enviesamentos; intenção científica sobre o mundo mesmo (NOTA - se sobre a mente, então a mente tal como é encontrada pela observação natural, não uma mente transcendental descoberta reflexivamente).

2.2.1. Observação direta (straight)

TÓPICOS - 3 fontes do conhecimento científico empírico - observação, experimentação e simulação. Observação direta ou simples - a fonte mais fundamental da ciência. Observação direta ou instrumental. "Acontecimentos" (events) e "fenómenos" (phenomena, padrões). Ex. Darwin - observação de fenómenos (padrões) como base para a teoria.

2.2.2. Extensão instrumental da observação (telescópios)

TÓPICOS - Condicionamento tecnológico do conhecimento científico, ciência como tecnologia aplicada! Humphreys - extensão da observação no espaço e no tempo por "aumentação" instrumental - [NOTA: cf. Aristóteles e tecnologia exossomática; Verbeek e mediação por "aumentação"]. Observação que constrói no espaço e no tempo os objetos "observados". Observação de estados passados para inferir os atuais. Problema dos métodos científicos reduzidos à observação - impossibilidade de variação dos fatores - problema particular na astronomia.

2.2.3. Extensão da observação pela prática (perícia)

TÓPICOS - Ex. paleontologia (N. Shubin): prática e reconhecimento dos dados relevantes; descontinuidade do desenvolvimento da capacitação de observação. Problema: se observação requer prática, então só quem a tem pode repetir a observação de outro, logo os requisitos de abertura pública (incluindo amadores) e de não-inquinação ou ausência de pressupostos (nem teórico-práticos) não serão absolutamente satisfeitos.

2.2.4. Formas de tornar a observação mais eficiente

TÓPICOS - Dificuldade de observação de fenómenos raros etc. 3 Formas comuns de aumentar a eficiência das observações: i) orientação da observação mediante modelos e teorias; ii) coordenação entre grupos de cientistas; iii) observação automatizada ou semi-automatizada (instrumentos eletrónicos e computorizados) e por crowd-sourcing (aberta à participação de amadores voluntários dispersos).

2.3. Métodos de Mill

TÓPICOS - Observação e relações causais - a lógica de inferências causais por J. Stuart Mill. 2 Métodos de Mill: do acordo, e do desacordo. "Condição", "resultado". Condições variáveis - "variáveis independentes"; resultados - "variáveis dependentes". Método do acordo (selecionar como causa a variáv. independ. partilhada por todos os casos com a mesma variáv. depend.). Método do desacordo (selecionar como causa a variáv. independ. que se verifica apenas no caso que também é o único a verificar a variáv. depend.). Ideia-base dos mét. Mill: Comparar a (não-)ocorrência de diversos fatores do fenómeno estudado. Insuficiência dos mét. Mill: não descartam fatores relevantes não considerados (condições ocultas, condições/causas comuns...).

2.4.1. Isolamento e criação de fenómenos (padrões) - experimentação

TÓPICOS - Problema da falta de eficiência da observação por raridade do fenómeno, ou da combinação dos fatores, que se quer testar... - produção artificial do fenómeno/combinação: intervenções experimentais. 2 razões da importância da intervenção experimental: a) criam novos fenómenos, b) isolam fenómenos do mundo natural. Ex. estudo da evolução das proteínas na extremidade de cromossomas: criação de moscas com versão alterada de 1 gene (mediante CRISPR-Cas9), para estudar isoladamente a evolução da espécie.

2.4.2. Lógica da experimentação

TÓPICOS - De intuições sobre a natureza da experimentação - secções anteriores - à caraterização geral da experimentação - esta secção. Cerne da experimentação: intervenção. Simplificação do processo para o compreender - "intervenção ideal" (Jim Woodward): controlo total das variáveis, variação ceteris paribus. Intervenção ideal e desenvolvimento dos mét. Mill - exemplos. Experimentação e estatística - quando os fenómenos são difíceis de detetar etc., a lógica mantém-se mas com uso de matemática estatística. Da "causalidade". problema dos mét. Mill: situação em que a causa será comum a fenómenos correlacionados mas independentes - ex. Correlação como sinal de causalidade, não como idêntica a esta. Denúncia da simplificação da formulação do método científico como: i) pesquisa básica, ii) hipótese, iii) teste, iv) in/verificação da hipótese - 1 aspeto desse simplismo: propósito da experimentação, ou da observação ou simulação, pode ser exploratório... e não o de testar hipóteses.

2.5. Simulações: empíricas e confiáveis?

TÓPICOS - Simulação: correr 1 modelo sob condições iniciais. Ex. modelo simples (e agent-based) de segregação (T. Schelling) - requisitos da modelação: a) princípio geral de comportamento dos agentes, e regra de aplicação do princípio em cada situação; b) condições iniciais. Funcionamento não-enviesado da simulação: correr o modelo sob condições iniciais aleatórias. Ex. modelo complexo da evolução climática - feita porque observação e experimentação do clima futuro não é possível. Modelação tem de considerar interações atmosféricas, oceanos, radiação solar... não sendo possível estabelecer 1 modelo único, fazem-se aproximações e simplificações. Que geram modelos aproximados mas distintos. Possibilidade de fatores contingentes - ex. quantidade da emissão de CO2 por atividade humana no futuro. Conveniência de correr um modelo sob cenários diferentes e estabelecendo resultados estatísticos (entre intervalos de valores etc.). Questões epistemológicas. i) Simulações são ainda empíricas? "Contra": frequentemente não requerem observações ou experimentações. "A favor": assemelham-se à experimentação na criação de condições de teste, consideração de condições artificiais, necessidade de inferência final sobre o mundo; simulação e observação - faz-se a 2ª para reconhecimento dos elementos do modelo e das condições iniciais; avaliação da simulação requer verificação da observação. Conclusão: simulação tem dimensão empírica. ii) Simulações são fiáveis (reliable)? a) sobre validade de 1 dada simulação - cf. métodos usados, reputações e interesses (financeiros...) dos investigadores etc.; b) sobre validade em geral da inferência por simulação - 3 questões em aberto sobre inferência científica: como se garante a não-negligência de fatores relevantes? como se garantem as homogeneidades entre o passado das observações e o futuro do resultado simulado, e entre um sistema observado e outro sistema simulado? - v. secção 3.

2.6. Deteção confiável

TÓPICOS - Pressuposto da constituição da ciência como baseada em observações, experimentações ou simulações: estas são separáveis de hipóteses, teorias e técnicas. Crítica de Grover Maxwell: não há demarcação clara entre observável e não-observável. Perceção, mediação instrumental, e construção do objeto "observado". Fundamento das ciências "é empírico" = esse fundamento como "deteção confiável" do que há no mundo. Centralidade epistemológica da questão da objetividade.



3.1. O poder do conhecimento coletivo

TÓPICOS - Ciência visa conhecer o mundo - relevância de "visa" (aim). "Objetividade" do conhecimento como apresentação do mundo tal como ele é. "Objetividade" do processo científico - uma vez não enviesado (biased) - v. secção anterior. Da esperança de a objetividade do processo facultar a objetividade do resultado - Weisberg: organização social da ciência como eliminação de enviesamentos e assim fonte de objetividade (cumprindo a esperança referida). Ilustração do reconhecimento do "elefante".

3.2. Definindo objetividade científica

TÓPICOS - Noção simplista e errada de objetividade - sujeito passivo obtém verdade por mera execução de um método. "Facto", "crença", "crença verdadeira". Possibilidade das crenças falsas. Questão da esperança de que processos objetivos garantam conhecimentos objetivos - não! 2 ex. Razão de se formular a objetividade científica não como um resultado mas como um propósito - "visar" descobrir factos. Consequência: "sucesso científico" depende do processo, não apenas do resultado; "conhecimento é tudo o que resulte do processo com esse propósito. Da subjetividade e valores como recursos do conhecimento objetivo. Valores epistémicos: precisão (accuracy); simplicidade (princípio da parcimónia - base: assunção da Natureza como económica e eficiente). Valores (e enviesamentos) não epistémicos que interferem com a ciência - ex. modelo de fertilização "Sleeping Beauty Prince Charming" (Helen Longino). Correções de enviesamentos por recuperação de pesquisas enjeitadas, segundo valores diferentes. Problema da possibilidade de objetividade ao nível individual - importância do trabalho coletivo ao longo do tempo. "Objetividade" e "confiança" ou "certeza virtual" - ex. tese de aquecimento global, datação do universo. Consenso mediante aumento de informação e crítica por pares. Revisão precisa e realística do significado de "objetividade científica" - a comunidade visa descobrir factos pela observação, experimentação e simulação, eliminando enviesamentos pelo confronto com novos dados e pela crítica por pares, ao longo do tempo.

3.2.1. Mecanismos da objetividade científica

TÓPICOS - Mecanismos que promovem a objetividade: 1º) no desenho de experiência e simulações - a) experimentação "cega"; b) experimentação aleatória; c) grupo de controlo - eliminação de variáveis que confundem. Objetividade e trabalho comunitário no desenho das experiências. 2ºa) crítica por pares logo em pré-publicações - parâmetros de avaliação - falhas metodológicas (incluindo lógicas); b) Discussão informal - v. Helen Longino, crítica pública e objetividade; c) inquinação do processo de publicação - vs. "pré-registo" de hipótese e correspondente metodologia; d) replicação de estudos e objetividade; e) meta-análise estatística e objetividade. Incremento da objetividade em consequência indireta da "regra de prioridade" (valor dos Mavericks)

3.2.2. Eliminando enviesamentos (shedding bias) e aproximação à verdade

TÓPICOS - Tese de Weisberg: a favor de progresso nas objetividades tanto do processo cognitivo como dos resultados deste. Da lógica fundamental da ciência à história da ciência (T. Khun) e reconhecimento de desacordos e mudanças. Contra o postulado da acumulação progressiva do conhecimento - a longo prazo verificam-se revoluções. "Período normal". "Paradigma". "Revolução científica" - problemas em teorias e explicações, mudança de paradigma. Mudança por conversão, não por argumentação racional, pois quaisquer parâmetros de avaliação são internos a algum paradigma ["incomensurabilidade"] - quebra de objetividade. Significados e paradigmas - ex. "espaço" usado diferentemente por Newton e por Einstein. Argumento contra a afirmação de progressividade - refutação por Weisberg por ilação na base de feitos científicos históricos. Pista de Khun: comunidade científica tanto resiste como se abre a mudanças na "visão do mundo" - sinal de objetividade (do processo). P. Godfrey-Smith (Khun): regras do equilíbrio resistência/mudança são implícitas nas estruturas sociais, não formalmente prescritivas. Correção por Khun da denúncia da sua conceção da ciência como irracionalista e subjetiva: contra a confiança anterior numa objetividade por aplicação de regras lógicas (procedimentais) que implementem precisão, simplicidade, frutuosidade, consistência... aquelas regras decorrem sempre da assunção destes valores na prática quotidiana da ciência. Regras vs. valores - determinismo prático vs. interpretação e escolhas individuais. Questão das hierarquias de valores epistémicos. T. Khun - uma mistura de objetividade - definida como partilha de valores ou acordo numa comunidade - e subjetividade - interpretações individuais na aplicação dos valores. Natureza social da ciência - de Khun a H. Longino. Base do argumento: ciência não é feita por indivíduos mas por comunidades [mudança de paradigma na reflexão sobre ciência!]. Questões relevantes do processo científico ao nível da comunidade - não das escolhas, mas das formas de evitar enviesamentos. "Criticismo intersubjetivo" e progresso do grau de objetividade. 4 Critérios para avaliar objetividade do processo científico num momento: i) processos de crítica (avaliação por pares...); ii) partilha de valores (precisão...); iii) resposta da comunidade às críticas que forem apresentadas; não-submissão à autoridade (política...), ou a conceções misóginas, racistas... Weisberg: não é só a objetividade do processo que tem progredido (Longino), em resultado a objetividade do conhecimento (aproximação à verdade) também tem.

3.3. Falhas na objetividade

TÓPICOS - Ex. de divergência entre o acolhimento público de um resultado científico (sobre relação entre vacinas e autismo) e a crítica desse resultado por pares. Ex. de promoção enviesada de teses/resultados (ainda A. Wakefield). Diferentes níveis de falha: do erro honesto (ex. razão de retração de artigo pelos autores) à fraude. casos intermédios: i) falsificação da avaliação por pares; ii) p-hacking (v. valor-p como diferença entre valores do grupo experimental e do grupo de controlo acima da qual se rejeita a "hipótese nula" (que essa diferença será casual) - diversificação de testes até obter resultados positivos (os normalmente publicáveis); problema do "caixote do lixo" (trashcan) das publicações (que enjeitam resultados negativos). P-hacking e uma crise na replicabilidade das experiências. Horizonte do p-hacking: as publicações - reação nestas: método do pré-registo das metodologias para decisão de publicação prévia aos resultados. Ex. nas ciências naturais de 1 erro também comum - o flogisto - mas também da sua correção comunitária ulterior. Ciência, verdade / diminuição do erro (B. Nosek). Declaração de interesses - facilitação da crítica aos enviesamentos (económicos, políticos...) dos autores. Questionamentos numa atitude crítica face aos resultados científicos publicados.

3.4. Ciência, pseudociência e incerteza

TÓPICOS - Cientificidade de cada teoria - problema teórico fundamental com consequências práticas. Karl Popper: problema da demarcação entre ciência e pseudociência. The Logic of Scientific Discovery - demarcação e falsificabilidade. Demarcação não pode ser pela veracidade (aceitabilidade da teoria) - ciências e pseudociências podem ambas ser falsas e verdadeiras. Solução do Círculo de Viena: 1 enunciado "científico" pode em princípio ser observado (Critério da Verificabilidade) - objeção: enunciado astrológicos podem sê-lo. Teorias em que Popper se baseou para o seu critério de falsificabilidade: teoria da relatividade geral teoria marxista da história, psicanálise - apenas a 1ª podia ser reconhecida como falsa na base de novas evidências, as outras 2 incorporavam quaisquer evidências como confirmações. "Enviesamento da confirmação". "Falsificabilidade" - incompatibilidade da teoria com certas observações possíveis. radicalidade de Popper: falsificabilidade é não apenas critério de demarcação, mas também prescrição normativa do trabalho científico - 2ª tese rejeitada em geral. Ex. usos do critério de Popper na discussão pública: i) Sen. Ted Cruz contra a cientificidade da teoria do aquecimento global por não ser falsificável - resposta de Michael Mann: teoria pode ser indiretamente falsificável pela falsificabilidade das teorias que ela implica (do efeito de estufa, e do aquecimento global como resultado do EE); confirmações até aqui das anteriores previsões da teoria das alterações climáticas. ii) Caso da condenação social, política e jurídica da teoria da evolução por pretensa pseudocientificidade - caso John Scopes, Butler Act e Monkey Trial; classificações do criacionismo como alternativa científica ou do evolucionismo como pseudociência - juízo de W.R. Overton, caraterísticas da ciência: falsificabilidade, testabilidade e revisibilidade; criacionismo não as satisfaz (é pseudociência), mas evolucionismo não será facilmente falsificável. Resposta de Philip Kitcher: dificuldade de falsificar a teoria da evolução deve-se à regra popperiana. Falibilismo (revisibilidade) é o distintivo da ciência (não faz sentido recusar evolucionismo por não ser absolutamente seguro). Refutação por Kitcher do critério de Popper: i) possibilidade de não se verificar 1 fenómeno previsto, por outro fator que não a falsidade da teoria - falsificacionismo arrisca eliminar teorias válidas; ii) possibilidade de alargamento de 1 teoria até a sua falsificabilidade - todas as teses poderão vir a ser "científicas". Descoberta de Neptuno, e 3 critérios complementares de demarcação, Kitcher: i) hipóteses auxiliares têm de ser testáveis; ii) estratégias resolutivas das ciências devem ser comuns [não ad hoc]; iii) teorias devem abrir outros campos de pesquisa. Os programas científicos são fecundos - geram livros, artefactos... Hitcher: demarcação faz-se atendendo ao comportamento da comunidade face a cada teoria. Conclusão de Weisberg sobre a possibilidade e o modo de produção de conhecimento objetivo.



4.1. A ciência na arena política

TÓPICOS - Tema da secção: objetividade e valores. Ex. H. Clinton na Conv. Democrát. e marchas pela ciência - intervenção pública a favor de racionalidade científica. Crística à oportunidade ou eficácia retórica dessas intervenções (R. Young, NYT). Weisberg: da questão política à questão tradicional factos vs. valores.

4.2. A ciência deve ser livre de valores?

TÓPICOS - Juízos de facto vs. juízos de valor. Avaliações diferentes do empreendimento científico global. Questão presente: value-free como ideal? (questão sobre a inversão do juízo de valor de que a sociedade se deve orientar segundo a ciência, H. Clinton). Posição tradicional: a ciência deve ser moralmente neutra (value-free ideal) - argumento. Critério de crenças verdadeiras. [Cf. "racionalidade tecnológica", von Wright!]. Crítica da crença na neutralidade moral da ciência - v. ciência tal qual se faz. Ex. implicação de valores morais no trabalho de S. Morton - S.J. Gould: enviesamentos acontecem, mas mantém-se o ideal value-free no escrutínio coletivo. Crítica de Helen Longino ao ideal value-free: v. "infradeterminação" dos factos [Quine, Duhem], decisões e "regras [pragmáticas] de polegar" - valores epistémicos. Contingência da hierarquia de valores, fundamento social. Efeito dos valores nas explicações que resultam da aplicação deles. Imbricação prática factos-valores, disputa epistemológica: value-free ideal vs. denúncia de ingenuidade da assunção desse ideal - ex. imbricação factos-valores, IPPC.

4.3. Liberdade científica e responsabilidade

TÓPICOS - Uma deontologia científica. Declaração de Responsabilidade Científica, AAAS: "liberdade científica" - liberdade de pesquisa (com limites), tradição iluminista, reação ao autoritarismo e ao populismo; "responsabilidade científica" - contra enviesamentos não-objetivos. AAAS - um condicionamento da prática científica por valores políticos. Weisberg: sentido das marchas pela ciência.

4.4. Cultivando o ceticismo científico

TÓPICOS - Conclusão para o público generalista: cultivar um ceticismo informado e crítico (não absoluto). Necessidade de crítica - v. fake news. Necessidade de informação - v. casos da indústria do tabaco, reações à teoria das alterações climáticas. Ex. de fontes de informação credíveis. Evolução tanto da ciência quanto da sociedade - Weisberg: a relação entre trabalhos científicos e público deverá aumentar.

Ideias-chave do conjunto de lições:

i) complexidade do empreendimento científico
ii) empirismo científico
iii) objetividade processual e organizacional
iv) enviesamentos humanos dos cientistas e retificação comunitária
v) imbricação entre factos e valores

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