Suponhamos os três porquinhos da fábula a lerem o
artigo “COP21 Paris climate talks: a
beginner’s guide”, do Financial Times (30/11) – um jornal de todo insuspeito de privilegiar quaisquer outros interesses em detrimento dos económicos. Ou melhor, o porquinho mais velho a lê-lo, que os irmãos mais novos logo darão outro uso ao computador!
beginner’s guide”, do Financial Times (30/11) – um jornal de todo insuspeito de privilegiar quaisquer outros interesses em detrimento dos económicos. Ou melhor, o porquinho mais velho a lê-lo, que os irmãos mais novos logo darão outro uso ao computador!
De um lado, aquele porquinho deparar-se-á com a comunidade internacional a assumir que o clima aqueceu cerca de 1ºC desde o
início da Revolução Industrial; que daí decorrem alterações gravosas já em
curso; que as emissões de carbono, por atividade humana, são relevantes para
esse aquecimento; e que será imprudente aumentar este último acima dos 2ºC.
Do outro lado, com os fracassos das COP2 (Kyoto) e
COP15 (Copenhaga), o mesmo porquinho reconhecerá a dificuldade de um acordo
político ecologicamente suficiente – seja entre os países que enriqueceram
graças a tais emissões durante o último século e meio (os quais querem que hoje
todos as reduzam), e os países que só agora estão a enriquecer (que exigem que
os anteriores paguem aquele dano ecológico global financiando-lhes energias
limpas); seja entre os defensores de objetivos ecológicos, de médio prazo, e os
defensores de interesses económicos e de emprego, de curtíssimo prazo, no
interior de países como os EUA.
Cuidadoso da sua segurança em casa como o sabemos ser,
creio que esses dois lados da leitura do FT,
mais a dos relatórios seguintes, poderiam sugerir ao nosso porquinho este
raciocínio simples:
1.
Segundo o relatório do Intergovernmental Panel on Climate
Changes (IPCC da ONU) em 2013, entre a passagem do séc. XX para o séc. XXI e o
fim deste último, se o atual processo não for alterado, a zona dos Açores deverá
sofrer um aquecimento de cerca de 1,5ºC. Mas com o espaço até à América a
aquecer acima dos 2ºC – e é a refrigeração, nomeadamente pelo mar, que tem
rebaixado os furacões que dali nos chegam para o grau de tempestades tropicais…
Enquanto a precipitação anual, nesta zona, deverá
diminuir cerca de 10% – à atenção de quem já se queixa de secas no verão. O que
não impedirá as chuvas torrenciais de aumentarem – à atenção da proteção civil,
e de toda a gente.
Qualquer porquinho mais velho sabe bem que as teorias
científicas, mesmo quando são unânimes, não oferecem uma certeza absoluta. Todavia
as que reúnem algum consenso – como as do IPCC – constituem os conhecimentos com
a melhor justificação possível à data.
Assim, ao porquinho mais velho açoriano, resta a
alternativa: ou bem que confia plenamente nas decisões de Paris. Ou bem que, na
sua gestão doméstica, começará a contar com gastos acrescidos na cobertura,
escoamentos… da sua habitação. Enquanto como eleitor, ou vereador municipal ou
secretário regional, nos próximos orçamentos fará pesar as rubricas da
captação, armazenamento e distribuição de água, das estruturas de preservação
das estradas, etc.
2.
Para avaliar a primeira dessas opções, suponhamos que o
esforçado porquinho também conhece um relatório de 2009 da Royal Society of
London. Então reconhecerá que a COP21, aliás como reunião política e não
científica que é – visando assim não os consensos teóricos, mas apenas os
eventualmente praticáveis – não parece ter colocado a questão como cientificamente
ela é hoje colocada.
A saber, em Paris apenas se terá discutido a redução
de emissões de carbono para a atmosfera, sem colocar a questão da geoengenharia,
fosse pelo mérito que esta possa ter, fosse até pela possível insuficiência de
quaisquer daquelas reduções para se travar o processo de aquecimento já
espoletado.
Com efeito, naquele relatório essa engenharia é
definida como uma “intervenção deliberada de larga escala no sistema climático
da Terra para moderar o aquecimento global”. Esta intervenção poderá tomar duas
formas: a remoção de dióxido de carbono da atmosfera, e a gestão da radiação
solar (sigla inglesa SRM). A primeira ainda não será técnica e economicamente viável,
mas a segunda sê-lo-á – por exemplo, injetando aerossóis de sulfato na
estratosfera.
No entanto esta tecnologia poderá ter efeitos
perniciosos na camada de ozono, em monções que condicionam certas regiões
agrícolas, etc. E em geral a SRM poderá ser socialmente apropriada como um
paliativo sobre o efeito das nossas emissões de carbono, dispensando-nos de as
controlar enquanto isso é possível.
Autores como David Keith ou Ken Caldeira assumem-se
assim como proponentes da SRM ainda que “relutantes”, por só por romantismo se
poder esperar da mera diminuição da emissão de carbono a resolução do problema
climático, dada a dimensão que este já terá ganho. Nada disto, porém, terá sido
politicamente sequer discutível em Paris.
Por certo reduzindo-se assim as expetativas do porquinho
mais velho açoriano sobre as decisões ali alcançadas.
3.
E, por exclusão de partes, começando a resolver-se a sua
alternativa acima formulada.
Como fui logo avançando no título, nem é porém com o
mais velho dos três porquinhos que estou particularmente preocupado. Não me
esqueço que foi ele que trouxe a maioria da humanidade a condições de vida – desde
a duração desta à segurança e à liberdade – até há dois séculos inimagináveis a
não ser para pequeníssimas minorias europeias e asiáticas. É certo que não
conseguiu evitar as Guerras Mundiais I e II, o Gulag… Mas, se não se furtar às
ilações de leituras como as anteriores, acredito que tem a capacidade de se
adaptar às alterações climáticas, e de evitar um cataclismo incomparavelmente
maior do que aqueles.
Já o que acontecerá aos porquinhos mais novos, e,
principalmente, se eles terão o poder de arrastar nas suas barafundas o irmão
mais velho, isso sim, me parece que nos deve preocupar muito.